segunda-feira, 27 de junho de 2016

DIABO




DIABO

O que me intriga nessa ilustração é a idéia de drama, de condenação, de sofrimento, de dor e, também, de possível redenção.
A figura do homem preso a um espinheiro e envolto por uma potente serpente, cuja boca escancarada prenuncia mais dor, sofrimento e morte, tudo isso num idílico e florido cenário, talvez o bíblico paraíso perdido, é, para mim, um bom comparativo, em termos de simbologia, com o Arcano XV do tarot, o Diabo.

Afinal quem, ou o que, é o Diabo? Quem é essa figura que perpassa a história da humanidade provocando sofrimentos de todas as espécies? Que enorme poder é esse que consegue derrotar a tal perfeição da criação divina? Que espaço, que lugar ele ocupa dentro desse Todo onipotente, omnipresente, a quem chamamos, entre outros nomes, de Deus? Se Deus (ou o nome que preferirem chamar, ou não, ao criador de todas a coisas) está presente e ocupa todos os lugares, até mesmo porque Ele é o Todo, onde então reside aquele ou aquilo a que chamamos de Mal? Qual é o espaço deixado vago por esse Deus presente e preenchendo todos os lugares, no qual o Mal habita? No coração e na mente dos homens? Mas se somos a imagem e a semelhança de quem, ou o que, nos criou, então, por mera dedução, o Mal que em nós reside é decorrente dessa herança genética... Se há um vácuo deixado para ser ocupado por qualquer outra coisa, ou entidade, então cai por terra o conceito assumido da omnipresença, omnisciência e omnipotência divina. Ou não.

Mas, conceitos e discussões teológicas `a parte, pois o que nos interessa aqui é a discussão comparativa entre as imagens, seus símbolos e significados, basta olharmos para o alto da ilustração para vermos, mãos espalmadas num ato receptivo, o que poderiamos interpretar como as "mãos" de Deus. Deus, envolto em uma nuvem de alvas flores e representado graficamente por um gesto de acolhimento, paira acima da sua criação, pronto para estender-lhe, novamente, os benefícios do Paraíso recusado. Ainda que a humanidade possa caminhar pelo vale das sombras, enfrentando os perigos da noite da alma, temendo o abandono nas profundas prisões do sofrimento, mesmo assim, num estado mais elevado da sua consciência, existe algo capaz de libera-lo.

Só sabemos o que é sofrer porque também conhecemos o estado de alegria; compreendemos o que é estar doente pois podemos comparar com o que é sentir-se bem e saudável; temos a noção da extensão dos efeitos de uma guerra por entendermos os benefícios dos tempos de paz; podemos não saber explicar perfeitamente o sentimento do amor, porém estamos conscientes que ele não é a mera paixão. Vivemos entre opostos, entre luz e sombra, entre extremos. O tão buscado "caminho do meio" nada mais é do que compreender onde se situam os limites, as fronteiras entre o Bem e o Mal absolutos, entre o que denominamos Deus e Diabo.

Sem tentar reinventar a roda, poderíamos refletir a respeito do conceito de que Deus, o Bem, o Positivo, é
o lado Luz, o lado vivo e progressivo de tudo, enquanto que o Diabo é aquilo que O justifica, Sua sombra, seu oposto complementar, aquilo que não pode ser chamado de bom, mas o Mal, o Negativo, o Destruidor, sem o qual não poderíamos compreende-Lo.
O Diabo, representa o que é menos elevado na natureza humana. É nossa condição de cegos para a luz, para a verdade e, portanto, para a felicidade (Paraíso). É nossa incapacidade de, ignorantes que somos, reconhecer que podemos, por opção, escolher o oposto, decidir por aquilo que possa nos trazer o contrário do Mal que vivenciamos. É um aspecto menos evoluído da nossa capacidade de abstração, que nos impede de "erguer os olhos do chão", de deixar de focar apenas os aspectos materiais e imediatistas da existência e buscar um sentido muito maior para tudo o que fazemos e provocamos.

 
 


Se na representação do Arcano XV, na quase absoluta maioria dos tarots existentes, encontramos uma figura muito mais animalesca do que humana subjugando um casal, é mesmo para reforçar a idéia de que o Mal é algo que vive na escuridão, mais ou menos escondido (tudo vai depender das nossas opções...) dentro de nós. Quando a ele concedemos o devido poder, nos domina e escraviza, mantendo-nos prisioneiros nas trevas da ignorância, enclausurados nas profundas cavernas do nosso medo, do desespero, da aflição, da falta de fé, da dependência, da desmedida ambição material.
Impedidos de vislumbrarmos o seu oposto, que é a própria liberdade de melhores escolhas, nos tornamos mineiros encerrados na busca de uma pedra preciosa qualquer, qualquer coisa que possa pretender justificar tudo aquilo que deixamos de ser quando optamos em, apenas, ter.

Alex Tarólogo

www.elementosdotarot.com.br
http://simboloseimagens.blogspot.com

quarta-feira, 22 de junho de 2016

EMPATE





EMPATE

A imagem de um prendedor de roupas, cada uma de suas partes de uma cor, como que dialogando entre si, pode ser comparada, em termos de simbologia, com o significado tarológico da carta do 2 de Espadas.
A figura pintada por Pamela Colman Smith para essa carta do tarot do Waite, onde uma figura vendada (sem fazer escolhas óbvias, racionais, influenciadas pelas aparências), está sentada (não tem pressa, a situação é demorada e demanda ajustes) de costas para o mar e a noite enluarada (evitando deixar-se decidir de forma unicamente emocional ou intuitiva), segura duas espadas de igual forma e tamanho (problemas, opiniões, possibilidades, opções, idéias, ações, etc. iguais em conteúdo e conseqüências), também expressa um conflito.
É uma decisão a ser tomada para a resolução de um problema, porém envolvendo opções que possuem o mesmo peso e medida. Ou seja, fica-se entre a cruz e a fogueira. É um beco sem saída.

Interessante observar que a carta 2 de Espadas retrata um momento de aparente paz. Há um silêncio, uma inatividade, uma imobilidade bastante frustrante e constrangedora na imagem. As espadas cruzada sobre o peito da mulher não irão permanecer nesse forçado equilíbrio por muito tempo. Mas, tempo é o que ela precisa para poder optar com maior segurança. Então, sentada, alheia às suas emoções e evitando confrontar-se com a realidade, ela espera.




E aí surge uma possível analogia com a ilustração do prendedor de roupas. Sua função é a de segurar, prender, imobilizar a roupa enquanto ela seca. Não é ele o agente da ação, mas um coadjuvante indispensável. Sem ele as roupas voariam ao sabor do vento e, ao invés de secarem, se perderiam ou se sujariam novamente. Ele controla o tempo para que a ação de secagem aconteça, realizada pelo sol e pelas correntes de ar.

O 2 de Espadas sugere ambivalência, conflito de interesses e opiniões aguarda-se uma escolha definitiva. Um trégua ou um acordo podem estar existindo, entretanto a situação não está resolvida e o problema continua ali, esperando uma solução. Talvez seja chegada a hora de parar de procrastinar e agir, optar, decidir, escolher. Talvez, não. Pode ser que a figura da carta do tarot esteja aguardando, sem decidir-se, esperando que a situação se resolva por si mesma, por fatores externos, sem o seu comprometimento.

No desenho do pregador de roupa, ambas as partes são iguais e válidas, necessárias para o funcionamento do artefato, ainda que opostas, antagônicas. Mas ele, também, não decide como ou em quanto tempo a roupa deve secar. Fica lá, parado, prendendo a situação, aguardando que o clima e o tempo decidam como, quando e porque faze-lo. Enquanto isso, espera.

Alex Tarólogo

http://simboloseimagens.blogspot.com
http://alextarologo.blogspot.com
http://petitlenormand.blogspot.com

sexta-feira, 17 de junho de 2016

EM TRÂNSITO





EM TRÂNSITO


A imagem de uma garrafa, que abriga em seu interior uma mensagem, vinda dar a uma praia qualquer é sempre interessante, ainda que seja um lugar comum em romances e filmes. O mar, nesse caso, funciona como um carteiro, cumpridor de sua missão, e que sabe onde entregar a “correspondência”.
Na verdade, não é uma correspondência, pois não há a menor condição de resposta. Para onde enviar? É, mesmo, uma mensagem. Uma declaração, um depoimento, um testemunho, uma consideração, um aviso, algumas reflexões, uma piada.

A imagem da garrafa lançada ao mar, que navega mares e oceanos, enfrenta perigos diversos na forma de tempestades, o sol implacável, animais, ventos, correntes marítimas, até aportar nas areias mornas e esperar que alguém a abra e leia se conteúdo, traz consigo uma ideia de um dever solitário.
Quando vi a foto acima, de imediato associei-a ao 6 de Espadas. É até bastante óbvio pois temos, em ambas, o elemento mar, a nave (barco/garrafa), a figura feminina à mercê de ser conduzida (pelo navegador do barco ou pelo destino).

Difícil, observando-se ambas, não associá-las à viagens, mudanças, transporte, transferência. E isso também está contido em seu significado taromântico. Entretanto, por estarmos lidando com uma carta do naipe de Espadas, estamos na esfera do racional, do pensamento abstrato, da análise mental, do discernimento, da verdade, das questões éticas e morais, do cálculo, da objetividade, da precisão.
O que é que essa mulher coberta por uma escura capa e abraçada a uma criança (?) transporta, em forma de 6 espadas? E para onde vai? E quem é o homem que dirige a embarcação?
Ou seja, esse conjunto de personagens em uma determinada situação que beira o surreal (afinal, 6 espadas fincadas no fundo de um barco de madeira não é muito normal...) é que inspira as associações e respostas que cada um obtém da sua atenta observação.

Mas não podemos desconsiderar duas coisas: mudança e raciocínio.




Olho, novamente, ambas imagens e creio ver alguém buscando um novo lugar onde seu conhecimento, seus princípios, aquilo em que ela acredita, a sua forma de pensar e avaliar o mundo encontrem guarida, encontrem ressonância, possam ser apreciados. É como se ela estivesse pensando: “Os incomodados que se retirem”, e ela própria abandonasse uma posição anterior, levando em sua bagagem aquilo que é seu (sua maneira de pensar e interpretar a realidade) e buscasse um porto seguro para si e para os seus.
Isso parece não acontecer de maneira muito fria ou calculista, pois é pelos mais ou menos conturbados movimentos das emoções, entre ondas e calmarias, que essa viagem se processa. Algo de importante, emocionalmente, deve ter sido abandonado em função dessa mudança. Grandes expectativas, geradoras de angústias e temores, fazem parte dessa resolução.

Chegará, ela, ao seu destino final exatamente como partiu? Terão o tempo no mar, o balanço do barco, a ausência de terra firme, a distância percorrida, o possível diálogo com o barqueiro (um mestre, um guru, um professor, um orientador?) modificado algo em sua filosofia, naquilo em que crê, em sua maneira pessoal de captar o ambiente que a cerca, na forma em que compactua ou rejeita a opinião e a verdade alheia? Talvez não. Provavelmente sim. Isso sempre dependerá de quanto ela está disposta em rever seus conceitos, reorganizar suas estruturas mentais, ter uma mente investigativa a tal ponto que a impulsiona a novas descobertas, análises e comparações.

De qualquer forma, ela mesma, essa mulher na garrafa, é a mensagem. Uma missionária de sua própria causa, navegando solitária, porém protegida por aquilo que sabe, que conhece.
Na garrafa, seu timoneiro é o próprio Universo que, muito possivelmente, irá desembarcá-la onde ela sempre deveria ter estado.


Alex Tarólogo

http://simboloseimagens.blogspot.com
http://alextarologo.blogspot.com
http://petitlenormand.blogspot.com

segunda-feira, 13 de junho de 2016

APEGO







APEGO

Na vida, somos peões e, ao mesmo tempo, jogadores. No grande tabuleiro da nossa existência, batalhas, algumas cruéis, são travadas constantemente. Sentimos a necessidade em nos avaliarmos, compararmos, testarmos e, de alguma maneira, acreditar que podemos chegar a um nivel de auto-conhecimento e a um patamar de segurança que venha servir como uma "blindagem" às adversidades da vida.

Não são poucas as pessoas que acumulam muito, na esperança de que isso lhes confira algum poder sobre os outros, que os faça destacar socialmente, que lhes permita a admiração e reconhecimento alheio. Vêem naquilo que adquiriram, e que podem exibir orgulhosamente, um troféu que lhes garanta uma certa forma de eternidade. Acreditam-se campeões e, portanto, com direito a olharem os demais do alto de seus pódios.

Alguns passam a vida nessa batalha, vendo a tudo e a todos como oportunidades de conquista, cobiçando prêmios e mais prêmios que vão colecionando, muito mais com o intuito de simplesmente te-los e exibi-los, que desfrutá-los. O desejo do poder, de ter forças e condições, de sentir-se dono da situação justifica a luta e as feridas no campo de batalha.
Outros, morbidamente temerosos de reconhecerem a Vida como o grande prêmio, e que mais dia, menos dia, terá que ser devolvido, exaurem-se montando esquemas de reservas, muitas vezes absurdos que, ao mesmo tempo que serve para distraí-los da ideia da efemeridade de tudo e de todos, é uma maneira de não viver o presente, mas sempre estar projetando para um futuro que, francamente, sempre será incerto.

Ter bom-senso, ser precavido, saber planejar, viver de acordo com as necessidades, ter autonomia e poder agir conforme o próprio discernimento, proporciona, sem dúvida alguma, a possibilidade de uma vida mais equilibrada e uma melhor harmonia entre os seus diferentes aspectos. Não há porque agir como o Louco, desarvoradamente, inconsequentemente, alienadamente, descompromissadamente. Esse é o lado oposto da gangorra onde deveríamos buscar equilibrar o Arcano 0, o Louco e o 4 de Ouros, pois entre o completo desapego e a dependência existe um mar de camadas, níveis, tonalidades e possibilidades.

Ao observar a imagem acima, que poderia ser interpretada como uma verdadeira luta em manter-se atado àquilo que normalmente acreditamos como bens que nos proporcionam segurança: dinheiro no banco, uma casa própria, um bom carro, ter alguma forma de poder sobre os demais, etc, o que mais atrai minha atenção é a maneira como o homem se vê e percebe os demais: todos os outros são adversários. Ele não se identifica com nenhum dos "times": nem com as pedras brancas, nem com as pretas. Ele sente-se único, o mais preparado, o mais inteligente, o que tem braços e mãos que lhe permitem agarrar aquilo que deseja. E ele que muito, ainda que repetido, em excesso. Ele quer tudo.




Vendo imagens como essa, ou como a criada por Pamela Colman Smith para o tarot do Waite, me ocorrem algumas frases bem populares como: "Caixão não tem gaveta" e "Quando se morre nada se leva". Na simplicidade e obviedade dessas expressões, existe uma verdade incontestável: nada levamos do que tivemos ou acumulamos "para tempos mais difíceis". Sem entrar no mérito e nem optar por nenhuma linha de pensamento que aborde alguma forma de vida (espiritual, racional, etc) após a morte, sabemos que nada nos acompanha, a não ser (talvez...) imagens, memórias, do que fomos. Nem sei se isso vai como bagagem, mas, com certeza, o carro importado, a conta na Suíça, o apartamento com vista para o mar, as jóias, o jatinho particular e o iate não embarcarão na mesma viagem. Entretanto, muitas vezes esquecemos (ou não queremos lembrar) disso tudo e nos acreditamos novos Tut-Ank-Amon e construímos um arsenal que poderá ser de alguma utilidade na vida após a vida.

Ter ambição e objetivos, buscar e desfrutar do conforto, poder viver a vida de maneira plena, com o mínimo de atribulações evitáveis, sentir-se capaz para realizar os desejos e satisfaze-los de forma harmoniosa é perfeitamente normal e traz dignidade a qualquer ser humano. O problema acontece quando alteramos os níveis dessa mesma ambição e nos tornamos prisioneiros dela.

Em ambas as imagens a figura demonstra enorme apego aquilo que possui. Tanto as moedas, na carta do 4 de Ouros, quanto os objetos que voam, na imagem principal, são, de alguma forma, extensão do corpo do homem. Numa, ele está imobilizado pelo peso dos mesmos. Noutra, ele luta para adquiri-los ou mante-los próximos.
Em ambas, o apego ao lado material da vida o domina. De alguma maneira, a desarmonia se estabelece e a vida fica limitada, para sempre, a um simples tabuleiro de xadrez.

Alex Tarólogo

http://simboloseimagens.blogspot.com
http://alextarologo.blogspot.com
http://petitlenormand.blogspot.com

quarta-feira, 8 de junho de 2016

EMOÇÕES





EMOÇÕES

Finalmente encontro, na imagem do poster acima, retratada de forma mais positiva, a saída daquele estado de profunda decepção do 5 de Copas.

Se observarmos bem a carta de tarot abaixo, pintada por Pamela Colman Smith para o tarot concebido pelo Waite, o que mais chama a atenção é a soturna figura humana, totalmente coberta pela enorme capa do luto que dela se apossa quando da constatação que 3 taças estão partidas, a seus pés. Sendo o naipe de Copas aquele que representa nossos sentimentos (amor, ódio, arrependimento, decepção, tédio, alegria, pesar, amizade, etc), o líquido contido nessas taças é tão fluido, escorregadio e volátil quanto as emoções que representa.

A negra figura lamenta profundamente a perda sofrida. Provavelmente havia investido todas as suas esperanças afetivas em alguém que, ao final, a decepcionou. Sente-se só, abandonada, afastada do convívio social, inerte, sem vontade de tomar a iniciativa de cruzar novamente o rio de suas emoções, desta vez mais experiente e com a possibilidade de utilizar-se do artificio de uma ponte, e reintegrar-se ao convívio do seu grupo.




Tão profunda é a sua dor que o paralisa e impede que veja que outras taças estão à sua espera. Não consegue lembrar-se de que nem tudo foram perdas, e que momentos felizes também foram vividos. Não consegue perceber que outras oportunidades estão à sua espera, bastando que ele pare de lamentar-se por aquilo que já se perdeu e dê a si mesmo uma nova chance.

Observando a antiga publicidade de um bom vinho do Porto, não pude evitar comparar as duas figuras e imaginar que o homem do poster poderia ser o mesmo do 5 de Copas, só que restabelecido, novamente ativo, pronto para seguir viagem, proporcionar-se novos motivos para sentir-se feliz. Quero acreditar que, tendo vivido intensamente a sua dor, ele tenha, finalmente, sepultado os sentimentos mórbidos, fossem de culpa ou de auto-piedade, e, livre das amarras da frustração, do medo, da vergonha, tenha se voltado e encontrado as taças remanescentes.

A sensação de que tudo esta perdido, de que nada mais vale a pena, de que não teria mais coragem para recomeçar, tudo isso desaparece ao perceber que a fonte que abastece as taças é a nascente de um caudaloso rio. Consciente disso, segue em frente, carregando cuidadosamente como a um troféu, as emoções que ainda pretende viver.

Alex Tarólogo

http://simboloseimagens.blogspot.com

sexta-feira, 3 de junho de 2016

JULGAMENTO






JULGAMENTO

Pois é. Esse anjo, com asas de penas não tão alvas e apoiado num caduceu, mais parece um Hermes "grunge" do que a séria e bem mais celestial figura do ser alado do tarot de Marseille. Hermes ou Gabriel, não importa, ambos são anunciadores de que algo importante está acontecendo.

A carta do Arcano XX, o Julgamento, remete `a ideia que fazemos do Julgamento Final, aquele prenúncio cristão do fim dos tempos, quando os mortos ressuscitarão para serem, junto aos vivos, julgados. Esse divino tribunal decidirá quem irá sentar-se junto ao Deus Criador e os demais, os infelizes que amargarão a eternidade no fogo dos infernos. As sentenças, naturalmente, dependerão exclusivamente de como cada um conduziu-se em sua existência terrena.

No tarot esse "julgamento" é pessoal, diferente daquele absolutamente racional proposto pela carta da Justiça. Neste, as variantes, a condição cármica de cada indivíduo é considerada e influenciará no resultado. É uma revisão da vida, considerando-se o processo e o grau de desenvolvimento obtido através das escolhas realizadas, das transformações sofridas e do percurso percorrido até o momento atual. Sim, porque, para o tarot, não há que se esperar pelo fim dos tempos para reavaliar-se. Esse exercício do acompanhamento do amadurecimento, em todos os sentidos da existência, é algo que pode ser feito a qualquer tempo.

Reavaliar, revisar, repensar, rever, reconsiderar, refletir, recuperar, são verbos intimamente ligados ao Julgamento proposto pelo Arcano XX. É olhar para traz e ver como foi o desenrolar da própria história. Consiste em levar em consideração que qualquer processo evolutivo implica numa melhoria, num lapidar, numa mutação para algo melhor, mais adequado, melhor preparado e adaptado. Considera-se, nesse tribunal, todos os atos praticados e, naturalmente, todas as conseqüências.

De quando em quando o anjo mensageiro se faz ouvir na labiríntica consciência de cada um de nós. Assim como as trombetas lembram os muçulmanos que é hora de orar e, portanto, elevar o pensamento além das fronteiras do aspecto material da vida, o Arcano XX alerta que é chegado o tempo de refletir se o percurso está correto. Se fazemos uma revisão veicular para nos garantirmos de que o carro está em condições de enfrentar as distancias e possíveis problemas da viagem, por que não fazer essa mesma "revisão" com a nossa pessoa? Por que não nos assegurarmos que estamos com os instrumentos certos, a experiência e o preparo necessários para continuarmos nosso caminhar, reavaliando o nosso trajeto e como foi o nosso desempenho até aqui?




Voltando a observar os detalhes da figura no alto desta página, é muito fácil perceber que todos os seres humanos são representados pelo mesmo personagem encapuzado, porém em situações distintas, como se na ilustração encontrássemos todos os momentos, até a presente data, da vida desse personagem. É como se fosse um filme da sua vida, porém num único fotograma, onde todas as suas acoes pudessem ser vistas ao mesmo tempo e em conexão com as demais. Diferente da ideia da Justiça humana, que considera nossos atos de forma mais compartimentada, no Julgamento o processo da existência é visto como um todo.

O gato que se enrosca aos pés do anjo pode muito bem estar representando a ressurreição, o voltar novamente `a vida plena, que é concedido a cada um que permite-se ouvir a voz da consciência, ou, mas literariamente, o chamado do anjo. Afinal, como diz o dito popular, 7 vidas tem os gatos. Disse Jesus a Pedro, de acordo com os evangelhos, que dever-se-ia perdoar(-se) 7 vezes 7, zerando a cada vez a culpa dos erros passados exatamente porque nos reconhecemos, confessionalmente, estarmos arrependidos, comprometendo-nos moralmente nunca mais comete-los e nos utilizarmos dessa experiência como um salto qualitativo em nosso crescimento espiritual.

Hermes, mensageiro dos deuses, ou Gabriel, o porta-voz de Deus, não faz nenhuma diferença, pois o que importa, em verdade, é que sejamos capazes de, ouvindo o sinal de alerta, sermos, nós mesmos, juízes dos nossos atos e intenções. Importante seria deixarmos de lado a fria e implacável espada da Justiça humana e podermos, reconhecendo nossas falhas, nos perdoar e renascer para uma nova chance, uma nova etapa, uma outra oportunidade de vida sob os auspiciosos e acolhedores raios de luz emanados dos céus. O final dos tempos ocorre a todo instante, pois o momento seguinte é sempre de renovação. O que chamamos de amanhã, de futuro, acontece no instante seguinte em que eu termino de digitar esta palavra. O Julgamento é um chamado `a consciência para que nos lembremos que renascer é uma constante necessária no longo processo da nossa evolução espiritual.

Alex Tarólogo

http://simboloseimagens.blogspot.com
http://alextarologo.blogspot.com
http://petitlenormand.blogspot.com